2ª. Parte
MARIA LOURDES OSTERNACH PEDROSO
Mesmo compreendendo a difícil situação dos Koch, o Büchner não quis comprar o material de pintura pois não sabia lidar com aquela infinidade de peças complicadas destinadas à decoração artística de paredes, aliás, que ele jamais sonhara fazer. Prontificou-se, entretanto, a contratar Koch como ajudante naquela obra, além disso ainda lhe adiantou algum dinheirinho para que pudesse levar algum alimento para a família naquele dia.
No dia seguinte, quarta-feira de Cinzas, Germano Koch iniciou cedo seu primeiro dia de trabalho remunerado no Brasil. A obra que fazia era simples, pintura corrida, sem arte. Depois de algum tempo alisando parede sem qualquer esforço de criação ele pediu permissão para fazer alguma coisa diferente. Teve consentimento para fazer o que bem entendesse. Animado começou a decorar a fachada com gosto. Não demorou muito para principiar a formação de um ajuntamento de pessoas diante da obra em andamento. As pessoas iam ando e surpreendiam-se com a novidade e acabavam ficando para irar a destreza do artista com os pincéis, que iam deixando um rastro demais de bonito. Coisa nunca vista!
Logo chegou um senhor imponente, devia ser alguém muito importante na cidade, e contratou Koch para pintar a sua casa, e depois desse apareceram outros, também interessados no trabalho do artista.
Naquela época os contratos de trabalho eram semanais. Geralmente nos sábados, às 16 horas, fazia-se o pagamento. Quando o Büchner acertava as contas com o Koch, bateu amigavelmente nas costas deste e perguntou à queima-roupa: Quer ser meu sócio? É claro que Koch aceitou.
Nessa época a família vivia em um quarto alugado, sem móveis. Eram apenas colchões no chão e caixotes servindo de mesa e cadeiras. Mas o trabalho começou a aparecer em grande quantidade e logo ele alugou uma casa e começou a guardar os trocados que eram em moedas. Num balde ia jogando tudo que conseguia economizar das despesas familiares. Um dia, em 1912, soube que um italiano queria vender um terreno, hoje esquina das ruas Teodoro Rosas com Pinheiro Machado. Foi depressa falar com o homem, já levando o seu rico balde. Acertaram o preço: um conto de réis! Germano Koch sentou-se e encheu a mesa do italiano com moedas. Foi mais difícil contar o dinheiro do que fechar o negócio.
Logo Koch começou a erguer a sua morada. Era a concretização do sonho tantas vezes acalentado na Europa: a casa própria. Na parede da frente, ao lado do grande portão de imbuia, ele desenhou: Germano Koch – Pintor (até 1939 a casa ainda existia, mas sem a pintura original).
Foram tempos de prosperidade ao imigrante, chegou a juntar uma pequena fortuna no trabalho de pintar paredes e os tetos das casas mais ricas. As paisagens que fazia eram enormes e lindas, ocupavam paredes inteiras das antigas mansões princesinas. Porém o sofrimento a que foram submetidos, nos primeiros anos de Brasil, ainda não cobrara todo o tributo que lhe era devido. A esposa, provavelmente moça de constituição delicada, não se recuperou bem das privações que aram na antiga colônia e acabou adoecendo dos pulmões. Na tentativa de salvá-la, Koch vendeu a casa e partiu para Curitiba na esperança de conseguir mais recursos no atendimento médico. Tudo em vão, pois ela faleceu em 1913. A sogra sobreviveu à filha e permaneceu com a família Koch até o fim da sua vida. Novas núpcias com uma senhora já viúva, mas não durou muito. Separaram-se. Em 1923 casou-se por contrato com Carlota Gaertner, filha de imigrantes e no mesmo ano o casal voltou para Ponta Grossa.
Mais ou menos em 1934, Germano soube que sua segunda esposa havia falecido em Curitiba, e imediatamente solicitou uma certidão de óbito para com ela preparar os papéis para regularizar sua situação familiar. Com o documento em mãos dirigiu-se ao Cartório Sant’Ana e lá, desapontado, soube que seu nome estava escrito errado: Kock. Portanto, oficialmente não era ele o viúvo do documento. Já quase totalmente surdo e muito nervoso não conseguia se entender com o pessoal do Cartório, saiu irritado e nunca mais se preocupou com o problema, por isso nunca se casou legalmente com Carlota.
Germano Koch faleceu em nossa cidade em 20 de outubro de 1950, depois de ter produzido uma vasta obra artística.
Ainda existem algumas telas de Germano Koch guardadas pelas raras pessoas que dão valor às criações artísticas nesta terra dos Campos Gerais. As peças são poucas e é só o que restou, pois, as mais belas pinturas murais, e estas eram o forte do artista, acabaram-se quase todas com a demolição das moradas da velha elite princesina.
Precisamos valorizar o que sobrou para não perdermos tudo de uma vez, para sempre!
Nota da coluna: importantes edificações da cidade foram decoradas por Germano Koch, como por exemplo a primeira sede do Clube Pontagrossense (1923), Catedral do Bispado (1927/1928), Capela do Hospital 26 de Outubro, Capela do Barão de Guaraúna no Cemitério São José, além de inúmeros palacetes que já não existem mais.
Maria Lourdes é professora e pesquisadora formada em História pela Faculdade de Filosofia de Ciências e Letras de Ponta Grossa e tem diversas obras editadas. É membro do Instituto Histórico, Geográfico e Etnográfico Paranaense, do Centro Cultural Prof. Faris Michaele e é fundadora da cadeira 37 da Academia de Letras dos Campos Gerais.