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Os cinemas de minha Terra

Plateia do antigo “Cine Theatro Renascença”. Sem data (acervo de Carlos M. Fontes Neto)

O cinema mudou a rotina dos brasileiros. Soube pelos mais velhos, que durante os anos difíceis da economia, o cinema era como uma fuga das dificuldades do dia a dia. Os astros preferidos, Clara Bow, Rodolfo Valentino, aos poucos abriram as portas para Charles Chaplin, Bete Davis, Carole Lombard e tantos outros. O cinema evoluiu muito em suas técnicas e nossa querida cidade teve, e manteve, ao longo da década de 1940, dois cinemas que o povo frequentava. Apesar de não ter sido o pioneiro, o Cine Império assumiu logo um ar mais popular.

ando a descrever algumas cenas do Império: em primeiro, porque eu o descrevi como popular, tinha uma sessão às quartas-feiras à noite com preço mais barato, quando eram projetados três filmes longa-metragem. Era a chamada “sessão pão-duro”. Cinema cheio, tinha que chegar cedo para conseguir ingresso.

Nas quartas-feiras tinha matinê à tarde, onde reavam o filme de domingo. Quase sempre dois filmes. Fui muitas vezes com uma amiga e com as mães junto.

E os filmes famosos e os nacionais? Era uma loucura. Filas enormes. Davam a volta na quadra. Era melhor aguardar um dia sem tanta gente, depois de duas semanas, mais ou menos. Dos nacionais, lembro a confusão dos primeiros dias com o filme “O Ébrio”, com Vicente Celestino cantando a música título do filme. Outro sucesso foi o primeiro filme de Mazzaropi, com seu caminhão mambembe e seu cachorro. Um sucesso.

Tinha seu lado mau, também. Em épocas de infestação de pulgas, o cheiro de DDT era espantoso. Além disso, o cinema foi construído sobre o riacho Pilão de Pedra, onde circulava muita coisa desonrosa. Pois é. Contudo, fazia parte de nossa vida, e sua destruição deixou mais uma ausência entre nós.

O outro cinema era muito querido. Aos domingos tinha a matinê do Rena (Cine Renascença), lugar de encontro dos jovens. Uma saudade de doer, com a compra de ingressos, o balcão das balas e chocolates, filmes muito bons. Muitas amigas iam sozinhas, desde os 12 anos, mas eu ia com minha avó ou minha mãe. Gostava de ir com vovó. Era ótima companhia. Fazia que não via um namoradinho sentado na fila de trás me paquerando.

Rena, filmes dos grandes estúdios. Principalmente os lançamentos da Metro. E com os musicais da Metro, sendo um dos mais famosos a Filha do Comandante. Aos domingos, à noite, assisti meus primeiros filmes e desenhos da Disney. Outros: “O vento levou”, “Rebeca”, “Assim caminha a humanidade”, “Tarde demais para esquecer”, tantos e tantos filmes. Sempre nas quintas feiras, outro inédito. Aos poucos consegui liberdade para ir com as amigas. Lá nos reuníamos com outros jovens e começaram assim muitos namoros que terminaram em casamento.

O Rena era nossa casa e, até 1950, lugar de ar os domingos. Então, eis que surge o Cine Ópera, dividindo o espaço com o Rena. Era uma opção moderna e, aos domingos, na hora de costume herdada do Rena, às 19:30, na parte superior do cinema era o ponto de encontro dos jovens.

A chegada do Cinemascope, desestruturou os palcos dos dois cinemas que eram utilizados para apresentações culturais. Cessaram, assim, as apresentações de balé, a vinda de mágicos, de artistas famosos, de orquestras. A modernização nem para tudo contribuiu.

O cinema dominou por muito tempo a rotina dos ponta-grossenses, até o surgimento, devagar, da televisão. As noites elegantes do Ópera e dos outros cinemas foram substituídas pela pipoca estourada na cozinha, pelos chinelos confortáveis e pela preguiçosa poltrona da sala.

*Aída Mansani Lavalle é historiadora, professora e escritora, membro da Academia de Letras dos Campos Gerais. Com esse texto memorial prestamos nossa homenagem à conquista do Oscar de Melhor Filme Internacional pelo filme brasileiro “Ainda estou aqui”.

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