Se você andar pela cidade sem a pressa do dia a dia e reparar nas coisas como elas são verá uma novidade que nos últimos anos foi se espalhando em frente às barbearias, além da elegância das fachadas e do aprimoramento dos profissionais. É o poste do barbeiro! Quando automático, ele causa a ilusão de que as listras coloridas descem indefinidamente. Mas de onde veio esse símbolo? Eu por exemplo, não lembro de tê-lo visto na minha infância. Mas ele não é uma novidade para os europeus e seus imigrantes. Ou para os norte-americanos, como se vê em alguns filmes de faroeste.
O barbeiro foi um personagem central desde a antiguidade. Nas aldeias europeias a loja do barbeiro era o ponto de encontro dos homens, pelo menos até meados do século XX. Nela eles se atualizavam e dela se espalhavam as novidades. De certo modo substituía a ágora grega. Pinturas, livros, contos e óperas têm o barbeiro como personagem principal.
O exemplo mais famoso é o Barbeiro de Sevilha, inspirado no livro do francês Pierre Beaumarchais de 1779. Virou a ópera famosa de Rossini. Quem não repete o Figaro… Fígaro… Fígaro… mesmo nada mais sabendo sobre ele. Não tarda uma loja de barbeiro é o ditado português lembrado pelo escritor português LA Palmerim em seu conto O barbeiro da aldeia de 1879. Nele o escritor reproduz as vastas funções do barbeiro do seu tempo.
Poste de barbeiro
Esse poste remonta ao início da Idade Média quando a arte de curar, particularmente a cirurgia, era exercida pelos cirurgiões-barbeiros ou barbeiros-cirurgiões. No século XIII, quando a medicina acadêmica era exercida principalmente por monges, o papa Inocêncio III proibiu que eles causassem sangramento, ou seja, a cirurgia. Foi aí que barbeiros, hábeis com instrumentos de corte, começaram a ser treinados para fazer pequenas cirurgias, drenar abscessos, fazer sangrias (prática comum na medicina antiga) e tirar dentes.
O barbeiro-cirurgião se deslocava em sua carroça colorida, geralmente portando um poste colorido que anunciava a sua presença. Se não viu, veja no filme O Físico um pouco sobre a aventura de curar no século X. Quanto às cores, branco, azul e vermelho, elas indicavam a função exercida: se cortava cabelos, fazia cirurgias e ou tirava dentes. Portanto, os barbeiros foram os precursores dos cirurgiões e dos dentistas. O poste de barbeiro é também um dos símbolos antigos da medicina.
Barbeiros no Brasil
E no Brasil? Bem por aqui, até o século XIX pelo menos, prevaleciam os barbeiros de origem portuguesa ou africana, escravos ou livres. Debret, que pintou o famoso quadro de Ponta Grossa, pintou quadros famosos sobre a arte de curar: Loja de Barbeiro e Cirurgião Negro. Entre nós o barbeiro em geral era também o Sangrador, ou seja, quem fazia sangrias, e tirava dentes. Era o Barbeiro-Sangrador-Dentista.
Em Curitiba
Pelo menos até a década de 1870 ainda encontramos anúncios de Loja de Barbeiro em Curitiba, como este: “José Alexandre Marques, chegado ultimamente a esta cidade, abriu sua loja de barbeiro à rua de S. Francisco n. 20. O mesmo aplica bixas, ventosas, chumba e limpa dentes.” Já em 1887 ele mudava o título da loja: “Salão Luzitano. Barbeiro e Cabelereiro. Neste importante estabelecimento encontra-se cabeleiras, barbas, bigodes para o carnaval.” Assim, parece que os serviços das barbearias iam mudando e deixando as operações para os cirurgiões e dentistas.
Barbeiro em Ponta Grossa
Na virada do século XX, a crônica de Ponta Grossa anota a presença do Chico Barbieri, barbeiro que vez por outra tirava dentes. Seu salão ficava na Praça da Matriz, atual Praça Mal Deodoro. Ele também se destacou como um animado carnavalesco.
Então, quando ar em frente a um desses postes que hoje enfeitam e indicam algumas das nossas barbearias, lembre-se que eles simbolizam e recordam uma história de mais de 500 anos da qual o barbeiro foi personagem central e predecessor dos nossos cirurgiões, incluindo, evidentemente, os dentistas.

*Arquivos do Museu Odontológico dos Campos Gerais Dr. Júlio Federmann. Hemeroteca Digital Brasileira. Google.
*José Tadeu Tesseroli de Siqueira é pesquisador e colaborador do Museu Odontológico Dr. Júlio Federmann. Frequentador da Biblioteca Paranista Eno Theodoro Wanke, da Academia de Letras dos Campos Gerais.